Postagens

      O telefone tocou na calada da noite, sacudindo a mesa. Meus olhos se abriram e saltariam para fora se não os tivesses segurado. Tudo bem, foi um susto, mas quem poderia ser?       Lutei contra meu corpo e escutei o terceiro toque. As luzes do relógio estavam confusas, porém tinha certeza de que tarde era. Me pus de pé, peguei o telefone e ainda embriagado pelo sono, esperei alguém falar.       - Cuidando bem da invenção? Da minha invenção?       Mantive o silêncio, mas perdi a calma. ''Invenção!'' A palavra ecoava dentro da minha mente. Não tive resposta para o enigma.       - In-ven...       - Não gagueje, homem, pois a minha invenção não merece aprisionar suas dúvidas e incertezas.        Foi o limite! Sou dependente do sono, mas não um covarde.       - Quem está falando, e que diabos de invenção é essa? - Perguntei.       - Meu caro...
      Um grito seco. Foi o bastante para sentir pena do ser de penas coloridas. Um ser, um papagaio. Ali, caído com o peito estufado e o bico truncado na parede branca desgastada pelo tempo.       Os minutos passaram, porém ele não acordou. Sintomas iniciais de alcoolismo descartados, e a certeza logo chegou. A idade deve ter pesado, se tratava de uma morte.       Hora do óbito:16:20. Hora do chá. Algo quente para tentar acabar com o vapor da tristeza.       Um vento soprava de trás para frente. As penas balançavam, indo e vindo como um balanço desgovernado. Uma tarde memorável, diria mais. Foi muito tarde para despedidas ou cerimônias.       Os amigos estavam voando por aí, cantando em muros e fugindo das atiradeiras.       A vizinhança não mais escutava o canto brando do papagaio tênue. A harmonia foi rompida. Lá se foi sem dizer adeus.               ...
Quando a noite chegar e o canto dos pardais for trocado pelos gritos escuros do silêncio noturno. E a sensação de que nunca mais haverá dia, tomar conta de ti.  Se as nuvens perderem o significado de ternura, se transformando em simples fumaça. Quando tudo isso refletir em ti pavor, lembre-se: A noite também é parte do dia, e este, assim como os pardais precisa descansar. E as nuvens, com ou sem ternura; parecendo ou não fumaça, são favos de imaginação.
Eu tentei.Tentei de tudo. Fui  no sol e na lua, comprei uma estrela e roubei outra. Corri de marte a saturno e de Vênus a netuno. Colori o céu várias vezes até ficar azul. Plantei bananeira do norte ao sul e comi todas as bananas. Limpei a galáxia com pano de chão, matei um unicórnio. Não, não, ele não morreu, apenas perdeu o chifre. Fui à Grécia, dancei com Atenas – a deusa da guerra, que me presenteou com amor. Afrodite é linda, mas o amor acabou. Voltei pra minha cama, acordei desse sonho, e o mai revoltante é que de todo esse tempo, ainda não entendi a vida.

Seu sorriso e o vagalume

Quando o seu olhar me atraiu, meu sabia que algo mais iria encontrar. Faltava descobrir, abrir todas as portas e os seus mistérios destrancar. Com calma, sem pressa alguma, apreciando sedento todas as formas e estruturas de seu falar. Com os anjos conversei, pois sua linguagem só poderia vir do céu. Prosa mansa envaidecida de amor, invadindo todo a todo tempo os sentidos dos pardais, e os fazendo cantar. Aproximei-me, fui mais alto sem ter medo de cair. Minha queda seria minha salvação, porque na certa, cairia nos montes verdejantes de seus braços. Enfim, seu olhar me moldou, arrancando as vendas que provavelmente me fizeram entrar. Quando as tais vendas caíram vi, então o seu sorrir. Acima de qualquer aurora ou lua cheia. Pouco de mim mostrei, porém tudo de ti estava bem perto, bem aqui. Ele coloriu o mar e a terra. Encantou o centro da terra  remota e pintou o vento, fazendo-o trocar de roupa. Sorria, vamos em frente. ...

Uma metáfora chamada mulher

É o vento que sopra na ladeira. A brasa viva que incendeia a lareira. O vasto vale de grama verde e aroma de jasmim beliscado pelo beija-flor. É o preto, o branco e a mistura de muitas cores. A voz da sereia, o encanto do mar revolto e o gosto de mil sabores. É a curva e reta; côncavo e convexo. O fácil e o complexo; o frio e o quente, que espanta as velhas dores. É a doença e a cura, a doce valsa que o sal mistura. Areia branca, céu azul, pedra sobre pedra e mistério incomum. Metáfora... Mulher pra quem o tempo dei. Chamada mulher, pura metáfora. Mulher e metáfora, e por ela me apaixonei.

Beijo egípcio

Imagem
Como dunas quentes o olhar  personificou os sentidos do andarilho  refém de suas pegadas. O calor atormentou os pensamentos  e a salvação estava no ventre coberto por charme da dançarina misteriosa,  que atraiu o pobre homem. Desgastado, com poucas saídas,  a miragem de águas frescas e  mansas se tornou impossível de ser vivida. Um grito de socorro queria ser  liberto, porém o medo de encontrar  as feras do deserto o intimidaram.  A salvação estava acima dele, nos lábios da dama de vestes brandas  escorrendo como lágrimas pelas areias ferventes. Lábios desenhados pelo tempo e  delineados com suavidade para ilustrar o cenário inabitável. O aroma exótico encantou as narinas  sedentas por misericórdia e encheu  de esperança aqueles olhos famintos. A dama levitou pelo desespero e  enfeitiçou com bom afeto o necessitado.  Sentiu-se feliz, mesmo quase morto pela perdição. Desabou na c...